Um olhar lúcido sobre a arte contemporânea
Escrito por: Por Pedro Scalon Netto (Cantor, compositor, músico e historiador)
“Uma coisa é certa, os instrumentos que estão hoje ao nosso dispor para produzirmos textos e imagens, disseminá-los na rede e fazê-los circular rapidamente e em escala quase global, é assombroso” – Pedro Scalon Netto
“A história da arte é o embate entre todas as experiências ópticas, os espaços inventados e as figurações” – Carl Einstein
O mundo da arte é bastante contraditório. É ao mesmo tempo comercial e erudito, acessível e exclusivo, denso e simples. Para muitos, isso representa um desafio. Penso que é a partir deste ponto que devemos discutir para compreender o que é mais provocativo quando se aborda a arte nos dias atuais. Tentando, ao menos, distinguir o essencial do superficial, sem abrir mão ou acreditar que superaremos as contradições. A independência da arte só é pertinente na medida em que está constantemente ameaçada, aspirando a ser algo além de arte.
Uma obra como a de Sean Scully nos ensina a observar o mundo, a parar para refletir sobre as coisas, ou seja, é pintura, é educação e, por que não, política – se considerarmos que a falta de tempo para observar é sempre uma forma de controle.
Com alguma surpresa (e grande interesse) temos observado a inclusão em exposições de arte de atividades ou práticas que não foram concebidas com essa finalidade. Desde Duchamp e seu ready-made, a demarcação entre arte e não-arte tem se tornado cada vez mais indistinta. No entanto, acredito que agora estamos testemunhando um novo fenômeno, que é: o modo como chamamos uma atividade, uma imagem ou um objeto não importa muito, pois tornar-se arte é uma possibilidade inerente a qualquer tipo de intervenção.
Este processo de tornar-se arte é efêmero e está vinculado a um conjunto específico de conexões que pode perder seu valor fora desse contexto e desse jogo de linguagem. Em resumo: as vanguardas no início do século XX ampliaram de forma significativa as possibilidades da arte; por sua vez, a arte contemporânea busca expandir as oportunidades da não-arte a partir da arte. Retomando uma expressão profética de Lygia Clark, trata-se de perceber estados de arte sem a presença da arte. Ou ainda, aprofundar o debate sobre o que a artista Tania Bruguera chama de Arte Útil.
Com alguma surpresa (e grande interesse) temos observado a inclusão em exposições de arte de atividades ou práticas que não foram concebidas com essa finalidade. Desde Duchamp e seu ready-made, a demarcação entre arte e não-arte tem se tornado cada vez mais indistinta. No entanto, acredito que agora estamos testemunhando um novo fenômeno, que é: o modo como chamamos uma atividade, uma imagem ou um objeto não importa muito, pois tornar-se arte é uma possibilidade inerente a qualquer tipo de intervenção. Este processo de tornar-se arte é efêmero e está vinculado a um conjunto específico de conexões que pode perder seu valor fora desse contexto e desse jogo de linguagem. Em resumo: as vanguardas no início do século XX ampliaram de forma significativa as possibilidades da arte; por sua vez, a arte contemporânea busca expandir as oportunidades da não-arte a partir da arte. Retomando uma expressão profética de Lygia Clark, trata-se de perceber estados de arte sem a presença da arte. Ou ainda, aprofundar o debate sobre o que a artista Tania Bruguera chama de Arte Útil.
É crucial enfatizar que a inclusão de um objeto criado com um propósito não artístico em uma exposição, resultando na atribuição de um caráter artístico à não arte, não desmerece nem impede que continuemos a considerar obras que tradicionalmente são vistas como arte ainda como tal. Uma bela pintura continuará a ser reconhecida como arte. Além disso, a atividade que temporariamente adquire a condição de arte não perde sua função original. Ela simplesmente introduz uma nova possibilidade, a de ser interpretada como arte, permitindo assim o desenvolvimento de uma análise interpretativa que não havia sido antecipada, além de gerar resultados práticos muitas vezes surpreendentes. Embora a arte deva ter a capacidade de ser valorizada por sua mera presença desinteressada, a adoção de desdobramentos práticos não contradiz essa força; pelo contrário, isso acrescenta novas dimensões, conferindo à própria utilidade desenvolvimentos que vão além do conhecimento técnico. A arte pode assumir algum papel sem precisar ser instrumental.
Uma coisa é certa, os instrumentos que estão hoje ao nosso dispor para produzirmos textos e imagens, disseminá-los na rede e fazê-los circular rapidamente e em escala quase global, é assombroso. Esta multidão de imagens em circulação carrega energias e potencialidades desconhecidas e que variam de acordo com as formas que venhamos a apresentá-las. As relações que venham a ser produzidas entre estes conjuntos de imagens feitas com intenções diversas acaba por ressignificá-las a cada contexto específico em que possam a ser mostradas e combinadas.
Para esclarecer essa situação, posso considerar a presença do grupo Forensic Architecture entre os selecionados para o Turner Prize de 2018. Em seu site, a organização se descreve de maneira bastante clara: “Forensic architecture é uma agência de investigação independente situada na Universidade Goldsmiths de Londres. Nossa equipe é composta por profissionais de diversas áreas, incluindo arquitetos, pesquisadores, artistas, cineastas, desenvolvedores de software, jornalistas de investigação, arqueólogos, advogados e cientistas. Nossas provas são apresentadas em diferentes fóruns, tribunais, comissões da verdade e documentos sobre direitos humanos. Também nos dedicamos ao estudo teórico e histórico das práticas forenses, visando avaliar o conceito de verdade pública” (https://www.forensic-architecture.org/).
Estar atualmente envolvido em uma exposição na Tate, que é um dos prêmios de arte contemporânea mais prestigiados, sugere a crença de que há algo na evolução desse trabalho de pesquisa forense que se alinha com as possibilidades contemporâneas da prática artística. Como destacou o crítico de arquitetura Rowan Moore, no The Guardian: “em um mundo cheio de imagens, onde quase tudo é visível, eles se esforçam para revelar o que estava oculto. Eles chamam sua atuação de contra forense, sendo a forense a arte da polícia.”