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Especialista explica polêmica sobre novos critérios para diagnosticar obesidade

Nova definição de obesidade abandona o IMC e foca mais na “saúde de verdade”

Uma comissão da Lancet, uma das mais prestigiadas e antigas revistas médicas do mundo, publicou, recentemente, um relatório global que redefine o diagnóstico e o tratamento da obesidade, marcando um avanço significativo. O documento, elaborado por especialistas internacionais, propõe uma abordagem que vai além do Índice de Massa Corporal (IMC), mas ainda há polêmicas sobre o assunto. Quem explica é o médico intensivista e nutrólogo  Dr José Israel Sanchez Robles. 

“A avaliação da condição passou a considerar múltiplos fatores, refletindo uma abordagem mais abrangente. Entretanto, a proposta levanta questionamentos sobre a exclusão de determinados critérios e as possíveis implicações no acesso a tratamentos. A principal mudança consiste na ampliação dos critérios diagnósticos. Em vez de fundamentar-se exclusivamente no Índice de Massa Corporal (IMC), o diagnóstico pode ser estabelecido a partir de três metodologias: a combinação do IMC com uma medida de tamanho corporal, a utilização de duas medidas de tamanho corporal independentemente do IMC ou a quantificação direta da gordura corporal por meio de exames, como a absorciometria de raios-X de dupla energia (DEXA)”, explica José Israel.

Ainda de acordo com o especialista, as medidas incluem circunferência da cintura, razão cintura-quadril e razão cintura-altura. Para o médico, essa mudança é bem-vinda, pois o IMC não reflete a composição corporal nem a distribuição da gordura, que pode ser subcutânea ou visceral. “A incorporação de critérios específicos para etnia e sexo representa um avanço na personalização do diagnóstico e tratamento. No entanto, a aplicabilidade da absorciometria de raios-X de dupla energia (DEXA) como método diagnóstico é questionável, considerando seu elevado custo e limitada acessibilidade na prática clínica”, completa.

Após o diagnóstico, a comissão da Lancet sugere classificar os indivíduos em duas categorias: obesidade clínica e pré-clínica. A obesidade clínica seria definida como uma doença crônica caracterizada por disfunções orgânicas ou redução da capacidade para atividades diárias, com base em 18 critérios específicos. Já a obesidade pré-clínica se aplica a pessoas com excesso de gordura, mas sem complicações de saúde. Neste ponto, José Israel destaca uma das principais críticas ao relatório: “A lista de 18 critérios exclui condições amplamente associadas à obesidade, como diabetes mellitus tipo 2 e transtornos de saúde mental. Por exemplo, um indivíduo com obesidade e diabetes tipo 2 não seria classificado como portador de obesidade clínica, o que poderia restringir seu acesso a tratamentos específicos e impactar negativamente a abordagem terapêutica dessa população.”, pontua ele.

Há, ainda, a recomendação de que pessoas com obesidade pré-clínica recebam apenas orientações como “comer menos e se movimentar mais”, que foi criticada por contradizer a necessidade de tratamento precoce e por reforçar o estigma, sugerindo que elas são responsáveis por sua condição. Além disso, há preocupações com o impacto nas seguradoras e pagadores de saúde, pois indivíduos com problemas relacionados ao peso, mas que não atendem aos 18 critérios da Lancet, podem ser negados tratamentos como medicamentos ou cirurgia bariátrica, criando uma barreira injusta para o cuidado proativo.

Para José Israel, a comissão da Lancet deu um passo importante ao abandonar o IMC como único critério para diagnosticar a obesidade, reconhecendo a complexidade da condição, mas entanto, a restrição dos critérios para complicações relacionadas à obesidade e a divisão entre obesidade clínica e pré-clínica geram preocupações significativas. “A premissa de que é necessário aguardar o desenvolvimento de complicações para iniciar intervenções terapêuticas eficazes é preocupante, pois pode reforçar o estigma associado à obesidade e ampliar as desigualdades no acesso ao cuidado. Diante desse cenário, ainda há importantes debates a serem conduzidos para garantir uma abordagem mais equitativa e baseada em evidências científicas”, conclui.

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